Especialista em Direito Eleitoral, o advogado José Antônio Rosa faz uma análise dos principais pontos da minirreforma eleitoral aprovada pela Câmara Federal.
Especialista em Direito Eleitoral, o advogado José Antônio Rosa faz uma análise dos principais pontos da minirreforma eleitoral aprovada pela Câmara Federal. Para ele, as duas leis e a Proposta de Emenda Constitucional (PEC), que ainda devem ser apreciadas pelo Senado, gera instabilidade e beneficia apenas os partidos e os políticos em mandato, prejudicando cada vez mais as candidaturas femininas e de negros.
Em entrevista ao Jornal da Cultura 90.7, nesta terça-feira (19.09), José Rosa lembrou que o Congresso promove mudanças constantes na legislação eleitoral. "Isso gera uma instabilidade eleitoral muito grande. Em alguns casos era preciso eles debruçarem sobre isso para poderem fazer uma concatenação dos prazos eleitorais com a lei eleitoral, coisa que não acontece. Mas não foi isso o que fizeram agora".
Segundo o advogado, a atual minirreforma que ainda deve ser apreciada no Senado Federal amplia as vantagens para os políticos que estão em mandato. "Quem está no mandato tem toda a vantagem do mundo, porque está no mandato. E ele continua com essa vantagem do mundo e querendo ampliá-las. É isso que eles estão fazendo agora nessa minirreforma eleitoral", pontuou José Rosa.
Para que passem a valer nas eleições municipais de 2024, as mudanças ainda precisam passar por nova votação no Senado e ser sancionadas pelo presidente Luiz Inácio Lula da Silva até 6 de outubro.
Candidaturas femininas
O advogado aponta que um dos retrocessos aprovado pela Câmara na minirreforma é sobre a divisão dos recursos do fundo eleitoral. Atualmente, os partidos políticos são obrigados a destinar no mínimo 30% dos recursos públicos para campanha eleitoral às candidaturas femininas. Se aprovada, a nova regra passará a valer mais para candidaturas proporcionais.
"Em 2018 em vários estados houve fraude com relação ao presidente partidário que era candidato a federal repassou dinheiro para mulher e a mulher repassou pra ele poder usar e foi condenado. Com essa flexibilização enfraquece a questão da mulher. Essa regra dos 30% para mulheres e para negros ou proporcional é uma regra que foi construída no TSE, não é uma regra de lei. Agora eles vieram e disseram o seguinte: qualquer que seja o número vamos passar 20%. Se tiver 50% de negros ou de mulheres vai passar só 20% e o restante vai ficar com o restante do dinheiro porque é branco ou porque é homem? Não pode ficar desta forma como está colocado".
Ficha Limpa
Outro retrocesso, segundo José Rosa é referente à Lei da Ficha Limpa. Atualmente, no caso de crimes comuns com pena de oito anos, o político fica inelegível durante o período de cumprimento da pena e mais oito anos após terminar.
"O que eles fizeram agora. Quando for aprovada por colegiado a condenação oito anos depois encerra. Tirou o cumprimento da pena. E mais ainda, conta também o tempo do trânsito em julgado, porque tem a decisão colegiada, é publicada a decisão, aí vem o tempo de recurso se não houve recurso transita em julgado. Então esse tempo também conta".
Para os casos de cassação do mandato parlamentar, o que vale na lei é que conta o prazo de oito anos da data do fim do mandato. "Agora conta os oito anos da data da cassação. Cassou aqui em setembro de 23. Oito anos depois ele está elegível. A mesma coisa vale para renúncia do mandato. Tem processo de cassação, você sabe que vai ser condenado e renuncia, é a mesma regra da cassação. Agora eles querem que vale da data da renúncia".
Calendário Eleitoral
A minirreforma muda também parte de datas e prazos do calendário eleitoral, entre eles o registro de candidaturas. O que, segundo José Rosa, é uma medida positiva. "A justificativa aí que eu acho até razoável é para ter mais tempo do registro das candidaturas".
Os partidos deverão apresentar os pedidos de candidatura à Justiça Eleitoral até as 19h de 31 de julho do ano eleitoral – atualmente vai até as 19h de 15 de agosto. A proposta também amplia o período de julgamento dos registros de candidatura para até cinco dias antes da eleição – hoje a Justiça Eleitoral tem que julgar os registros em até 20 dias antes da disputa nas urnas.
As convenções eleitorais para escolha de candidatos deverão ocorrer entre 10 e 25 de julho do ano eleitoral – atualmente vai de 20 de julho a 5 de agosto do ano eleitoral.
Prestação de contas
No caso da prestação de contas a minirreforma também mudou as regras nas campanhas eleitorais. Pelo projeto aprovado na Câmara, se um candidato não tiver movimentação financeira, não será necessário prestar contas à Justiça Eleitoral. Além disso, a disponibilização parcial dos dados acaba e os candidatos só terão que prestar contas depois das eleições.
"Eu acho que nesse ponto não tira a questão da transparência. Porque o que vem acontecendo desde que foi aprovada essa lei é que as vezes, por algum motivo ou outro os contadores não informavam isso na prestação de contas, ou informavam uma semana depois ou então segurava essas informações para informar no mês seguinte. Mas esse erro é um erro formal. A informação está lá, só está atrasada. Então não tinha uma punição para isso e tinha aquele grande problema de ter que estar justificando. Tanto é ruim para o advogado, como para o candidato e para Justiça Eleitoral", pontuou José Rosa.
O texto também não prevê sanções a partidos com contas rejeitadas no segundo semestre de anos eleitorais, sendo que a falta da prestação de contas só implica na suspensão de novas cotas do Fundo Partidário. Atualmente, a legislação permite o bloqueio total do Fundo Partidário. "Atualmente, quando não presta contas ou presta contas e é reprovada o juiz suspende por até um ano dele (partido) receber o fundo partidário. Agora eles tiraram isso, não tem como suspender".
O advogado lembra ainda que na lei anterior os partidos eram obrigados a devolver o fundo partidário até que se regularizasse ou cumprisse a pena. "Agora não, o que está na conta pode ser usado, fica lá, vai ser usado do jeito que ele entender e ele só terá a restrição enquanto ele não regulariza a prestação de contas. Regularizou acabou".
Outro ponto é que antes o Fundo Partidário não poderia ser investido em bens permanentes. "Agora pode até comprar avião, não tem problema nenhum. Se a lei for aprovada. Que é um absurdo, isso é dinheiro público", comentou o advogado.
Confira a íntegra da entrevista: