Após repercussão sobre a invasão à casa de uma empresária em um condomínio de luxo em Cuiabá o delegado Bruno França Ferreira pediu afastamento, não remunerado, de 30 dias de suas funções. Ele confirmou, por meio de nota, que não agiu por ordem de mandado, mas sim por ter entendido que houve situação de flagrante em decorrência do descumprimento de medida protetiva por parte da empresária.
No documento encaminhado à imprensa Bruno França afirma que a mulher vem há meses "perseguindo, humilhando e aterrorizando" seu enteado de 13 anos "de maneira injustificada". Foi por causa disso, segundo ele, que a Justiça deferiu o pedido de medida protetiva.
Ele relatou que na noite da última segunda-feira (28) a empresária foi até a quadra poliesportiva onde estava o garoto e "iniciou os ataques". O adolescente então teria se refugiado na casa de um amigo e pedido socorro. França afirmou que o garoto possui vídeos dos ataques.
"Diferente da forma expositiva que a conduzida vem tratando o caso, expondo publicamente procedimentos em que estão envolvidos direitos de crianças e adolescentes, nunca divulguei de forma extraprocessual os vídeos das agressões cometidas pela conduzida, em especial os vídeos gravados pela vítima, o menor J. de treze anos, em estado de pânico, no início da noite de 28/11/2022".
O delegado disse que quando seu enteado relatou o ocorrido ele entendeu que se tratava de situação de flagrante e solicitou apoio de diversos colegas da Polícia Civil. Ele esclareceu que os policiais da Gerência de Operações Especiais (GOE), que acompanharam ele, não têm responsabilidade pelo ocorrido.
"Desde já gostaria de deixar claro que a decisão de realizar a prisão é de responsabilidade única e exclusiva minha, tendo os colegas da GOE inclusive tentado me acalmar nos momentos de maior emoção. Não possuem qualquer responsabilidade, apenas parceria e lealdade para atender o chamado de um policial em necessidade".
Bruno França ainda disse que não apontou a arma de fogo diretamente para ninguém, mas reconheceu que se excedeu na "verbalização dirigida à conduzida". Também afirmou que se arrepende pelo susto causado à criança que estava na casa e pediu desculpas ao advogado Rodrigo Pouso, que foi alvo de suas ofensas na delegacia.
Por meio de nota a Seccional de Mato Grosso da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB-MT) se manifestou, novamente, sobre o caso, desta vez pedindo o afastamento do delegado. Ele confirmou que já tomou conhecimento do pedido, que foi protocolado junto à Corregedoria da PJC, e decidiu tomar iniciativa de pedir seu afastamento temporário.
"Se os nobres colegas entendem que é melhor para saúde do procedimento que eu momentaneamente me afaste de minhas funções, voluntariamente atendo o pleito. Ademais, não entendo como justo e razoável que eu seja ressarcido pelos cofres públicos durante a averiguação de excessos verbais que cometi em uma abordagem. [...] solicitei à Corregedoria de Polícia Civil meu afastamento não remunerado pelo prazo de 30 dias, renováveis por mais 30 se entenderem necessário ou até o final das apurações".
Por fim Bruno França reformou que se arrepende por ter extrapolado na verbalização durante o ocorrido, mas a "decisão de enfrentar a agressora e realizar sua captura, tal conduta não possui qualquer ilicitude e não goza de arrependimento de minha parte".
Leia a nota da OAB na íntegra:
A Ordem dos Advogados do Brasil - Seccional Mato Grosso (OAB-MT) representou contra o delegado Bruno França Ferreira, nesta quarta-feira (30), junto à Corregedoria Geral da Polícia Civil do Estado, requerendo o afastamento preventivo dele do cargo e a instauração de Processo Administrativo Disciplinar, para avaliar se sua conduta foi condizente com a função que exerce.
Como foi amplamente divulgado pela imprensa, o delegado, além de atacar e proferir ofensas ao advogado Rodrigo Pouso Miranda, enquanto ele estava no exercício profissional, também invadiu uma casa em um condomínio de Cuiabá, armado com uma pistola e arrombando a porta, junto com outros três agentes, para prender uma mulher, supostamente agindo em interesse próprio.
Na abordagem, o delegado xingou e fez violentas ameaças, inclusive diante de uma criança de 4 anos, como mostra vídeo compartilhado publicamente.
A representação é assinada pela presidente da OAB-MT, Gisela Cardoso, e procuradores da instituição.
Leia a nota do delegado Bruno França na íntegra:
Na noite do dia 28/11/2022 realizei a captura em flagrante de uma mulher sob a justificativa de estar ameaçando, injuriando e descumprindo medida protetiva existente em favor de J., meu enteado de treze anos.
Conforme registrado em procedimento sigiloso na Delegacia Especializada de Direitos da Criança e do Adolescente, há meses a conduzida vem perseguindo, humilhando e aterrorizando o menor de maneira injustificada, motivo este que levou o Poder Judiciário a deferir pedido de medida protetiva em favor do infante.
Consta demonstrado em procedimento investigativo que a autuada se deslocou até a quadra poliesportiva em que se encontrava a vítima e iniciou os ataques, recorrentes e injustificáveis, contra o adolescente que, após se refugiar na casa de um amigo, pediu socorro.
Após o menor ser resgatado e me relatar os fatos entendi que se tratava de situação flagrancial, motivo pelo qual solicitei apoio a diversos colegas da Polícia Civil para efetuar a prisão. Após sortidos pedidos, fui atendido pelos colegas da Gerência de Operações Especiais.
Diferente da forma expositiva que a conduzida vem tratando o caso, expondo publicamente procedimentos em que estão envolvidos direitos de crianças e adolescentes, nunca divulguei de forma extraprocessual os vídeos das agressões cometidas pela conduzida, em especial os vídeos gravados pela vítima, o menor J. de treze anos, em estado de pânico, no início da noite de 28/11/2022.
Desde já gostaria de deixar claro que a decisão de realizar a prisão é de responsabilidade única e exclusiva minha, tendo os colegas da GOE inclusive tentado me acalmar nos momentos de maior emoção. Não possuem qualquer responsabilidade, apenas parceria e lealdade para atender o chamado de um policial em necessidade.
Após bater a porta sem resposta e, considerando a situação flagrancial, decidi por adentrar a residência para efetuar a captura. Diferente do falsamente alegado de forma incessante pela conduzida, em nenhum momento apontei arma de fogo para nenhuma das pessoas na casa. As próprias imagens do momento da abordagem demonstram que a arma esteve o tempo todo, que inclusive foi curto, apontada para baixo como reza o procedimento.
Todavia é necessário que eu reconheça, publicamente e de forma humilde, que me excedi na verbalização dirigida à conduzida no momento da abordagem. Isso foi um erro pelo qual peço, a todos, as mais sinceras desculpas. Tal excesso, em que pese ser injustificável, é alicerçado por certa compreensividade, considerando que me encontrava em situação em que meu enteado estava sendo vitimado e, minutos antes, havia se dirigido a mim em estado de terror.
Peço ainda desculpas pelo susto causado à criança inocente que se encontrava dentro da residência. Não sabíamos da presença desta no interior do cômodo antes da entrada e, desde o ocorrido, a ideia do medo que causei a essa menina é, de longe, aquilo que mais tem me machucado.
A Polícia Civil existe para proteger as pessoas e não para assustá-las, motivo pelo qual espero que um dia essa criança possa me perdoar.
Gostaria de enfatizar que, em que pese a violenta emoção que me encontrava no momento, não houve contato físico com nenhuma das pessoas da residência.
Esclareço ainda que, ao contrário do que vem sendo noticiado, sequer acompanhei a conduzida na viatura durante o trajeto até a Central de Flagrantes. Pelo contrário, me desloquei em veículo distinto exatamente para que a conduzida pudesse ser transportada do lado de dentro da viatura e não no local destinado aos presos.
Aos membros da Ordem dos Advogados do Brasil que por tantos anos ombreei em busca de justiça, peço desculpas pelo ato injustificável que realizei em desfavor do Dr. Rodrigo Pouso. Esclareço que no momento das ofensas o procedimento de condução já havia terminado e me encontrava no saguão da delegacia dando apoio ao meu enteado que aguardava para ser ouvido.
Peço, sinceramente, que me desculpem.
Enfatizo que até o presente momento jamais fui representado, sequer uma vez, pelo Ministério Público ou pela Ordem dos Advogados do Brasil por atos cometidos no exercício de minha profissão.
Chegou ao meu conhecimento que a Ordem dos Advogados do Brasil entendeu por bem que eu seja afastado das minhas funções durante o esclarecimento dos fatos, tendo realizado pedido à Corregedoria de Polícia Civil.
Se os nobres colegas entendem que é melhor para saúde do procedimento que eu momentaneamente me afaste de minhas funções, voluntariamente atendo o pleito. Ademais, não entendo como justo e razoável que eu seja ressarcido pelos cofres públicos durante a averiguação de excessos verbais que cometi em uma abordagem.
Logo, desde já, antecipo que solicitei à Corregedoria de Polícia Civil meu afastamento não remunerado pelo prazo de 30 dias, renováveis por mais 30 se entenderem necessário ou até o final das apurações.
Peço desculpas também aos membros da sociedade que, direta ou indiretamente, se sentiram ofendidos pelo ocorrido tendo em vista as imagens divulgadas fora do contexto dos fatos. Fatos estes que serão obviamente esclarecidos.
Agradeço o apoio a mim dispensado pelas famílias das outras crianças vitimadas pela conduzida.
Por fim, em resposta àqueles que questionam se me arrependo do ocorrido, informo que estou profundamente arrependido por ter me extrapolado na verbalização realizada dentro do domicílio da conduzida.
Quanto à decisão de enfrentar a agressora e realizar sua captura, tal conduta não possui qualquer ilicitude e não goza de arrependimento de minha parte. Desde a noite de 28/11/2022 venho sendo atacado na imprensa de forma injusta e não verdadeira pela conduzida. Todavia, desde a noite de 28/11/2022 meu enteado está, finalmente, protegido e seguro.
A todos, de coração, minhas mais sinceras desculpas.