Brasil e Paraguai estão em ano de renegociação do acordo referente a Itaipu, que durou 50 anos e venceu no último mês. No mesmo momento em que os dois países precisam se reunir para discutir uma renovação desse tratado que estabelece a parceria entre os dois países para a geração e comercialização de energia, novos líderes assumiram o governo de seus países. De um lado, o presidente do Brasil, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que está há cinco meses no poder e tem uma ideologia ligada à esquerda, do outro, o conservador Santiago Peña, que venceu as eleições no último dia 30 e deu ao Partido Colorado, que está há 70 anos no poder, mais cinco anos de governo. Em mensagem enviada ao paraguaio, o petista o parabenizou pela vitória e disse que trabalhará com o novo líder do país vizinho por uma maior integração bilateral. “Vamos trabalhar juntos por relações cada vez melhores e mais fortes entre nossos países, e por uma América do Sul com mais união, desenvolvimento e prosperidade", escreveu Lula. Desde o começo das eleições, os brasileiros estavam de olho nos possíveis resultados, ainda mais agora, com a política do governo petista de reaproximação com os países do sul e o fortalecimento do Mercosul, além da renegociação dos novos termos de distribuição dos benefícios da hidrelétrica de Itaipu, sobre a qual o Paraguai espera que o Brasil pague mais pelo excedente de energia que vende ao vizinho. A questão gerou divergências entre os candidatos à presidência no Paraguai, por isso, o Brasil aguardava as eleições para iniciar as negociações. A vitória de Peña, um líder de direita, foi uma vantagem para o Brasil. Com o resultado, o Paraguai se consolida como uma exceção na América Latina em meio a tantos governos de esquerda.
“A relação entre os países tende a melhorar, por razões específicas. A primeira é que há uma continuidade na dominância de poder do Paraguai com a eleição do Santiago Peña. A segunda é que o Partido Colorado domina há anos a região e independentemente do perfil dos governos brasileiros, sempre teve uma relação positiva”, explica Eduardo Fayet, consultor e especialista em Relações Institucionais e Governamentais. Fayet acredita que o relacionamento entre os países deve ser uma relação pragmática, como acontece há anos. “Acho que uma das questões sobre as quais deve haver uma discussão é em relação à energia elétrica em função de Itaipu, principalmente porque o Brasil é um grande consumidor e compra o recurso dos paraguaios, que não utilizam tudo o que produzem”, afirma. O especialista acrescenta que será necessário chegar a um bom termo para os dois lados, “considerando que o Brasil precisa de mais energia para poder crescer a taxa o suficiente para dar conta do seu crescimento populacional e das suas demandas sociais, econômicas e políticas”. Regiane Nitsch Bressan, professora de Relações Internacionais da Unifesp, pontua que as relações entre os países é histórica e quase que de dependência por parte dos paraguaios. Ela vê que a mudança de governo tem um impacto relativamente pequeno, dada a sua condição de dependência e o fato de o Brasil estar retomando laços com a região. “O Brasil estando interessado, não tenho dúvidas de que vai tentar manter e continuar com relações cada vez mais intensas”. O Paraguai é um país pequeno e dependente de seus vizinhos para ter acesso ao mar, o que faz com que sua política externa não mude. A especialista em Mercosul enfatiza que, a despeito do partido político no poder, o Brasil muitas vezes “atua com seu peso político e econômico para seus interesses, que nem sempre são favoráveis ao combate às desigualdades e à redução das assimetrias existentes na região”.
Ela relembra que ao longo desses 70 anos, por necessidade do Paraguai, o Brasil manteve um diálogo contínuo – o país ainda paga o preço por causa da Guerra do Paraguai, que aconteceu de 1864 até 1870. “O Partido Colorado de fato não deu possibilidade de alternância no poder, isso mostra que o país é um conservador que teve dificuldade de aplicar nova políticas sociais e econômicas que ajudariam o país a diminuir a pobreza e a desigualdade histórica. Vejo com cautela essa manutenção do poder devido à situação do país”, diz a professora. Eduardo Fayet destaca que, além da economia focada em agricultura, que gera pouco valor agregado para a própria nação, e o pouco desenvolvimento no sentido de tecnologia e inovação, o país também sofre com a questão das atividades criminosas, como o contrabando de drogas. “Eles se mantiveram com produtos de matérias-primas e commodities. Não ter industrialização, não é só riqueza, é a falta de emprego e exportação”, fala Regiane, que ainda pontua que esse será um dos maiores problemas que Santiago Peña terá que solucionar em seus anos de governo. “Ele poderia escolher alguns produtos e ser internacionalmente competitivo. O país se mantém dependente do capital estrangeiro. A industrialização seria uma forma de diminuir a assimetria”. Ambos os especialistas falam que, por mais que o Paraguai seja mais dependente do Brasil do que o contrário, a relação entre eles é importante. Até porque, todas as decisões do Mercosul são por unanimidade, ou seja, faz com que os países sejam dependentes uns dos outros. “O Brasil pretende dar sequência à negociação com Mercosul e União Europeia, e o Paraguai precisa ratificar o acordo para ele entrar em vigor”, fala a professora, relembrando que o ingresso da Bolívia na organização depende da aprovação dos paraguaios.
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