A ditadura da Nicarágua, que fechou mais de 3.300 organizações sociais nos últimos anos, encerrou a fundação católica Fraternidade Pobres de Jesucristo, na qual colaboravam quatro freiras brasileiras que já deixaram o país, e ordenou a transferência de seus bens para o Estado, conforme relatado nesta terça-feira (5) pelo diário oficial La Gaceta.
Registrada formalmente na Nicarágua em 2019, a associação religiosa trabalhava no país há sete anos, fornecendo alimentos e roupas para os moradores de comunidades pobres do departamento (província) ocidental de León, onde estava sediada.
O fechamento da organização religiosa consta em um acordo ministerial assinado pela Ministra do Interior, María Amelia Coronel Kinloch, no qual foi indicado que a associação religiosa não havia renovado sua diretoria desde 2021, nem havia relatado suas demonstrações financeiras entre 2020 e 2022.
Os argumentos são semelhantes aos aplicados a outras mais de 3.300 ONGs que foram fechadas nos últimos anos pelo governo de Daniel Ortega. Diretores de várias ONGs fechadas denunciaram que desde 2020 o governo não permitia que eles atualizassem seus registros legais no Ministério do Interior.
“A Fundação Fraternidade Pobres de Jesus Cristo, com as infrações mencionadas anteriormente, dificulta o controle e a supervisão” por parte do Ministério do Interior e “não promove políticas de transparência na administração dos fundos que administra”, afirmou o texto oficial.
Além de dissolver a Fraternidade Pobres de Jesus Cristo, o Ministério do Interior determinou a confiscação de seus bens, ordenando à Procuradoria Geral da República que “transfira seus bens móveis ou imóveis” para o Estado da Nicarágua.
A sede da fundação católica situada em León, a 90 quilômetros de Manágua, era administrada por quatro missionárias de nacionalidade brasileira, que na segunda-feira viajaram para El Salvador para continuar seu trabalho religioso no país, conforme confirmado pela própria congregação.
A saída das freiras e o fechamento da ONG ocorrem após meses de tensões entre o governo sandinista e a Igreja Católica, cujo bispo, Monsenhor Rolando Álvarez, cumpre uma sentença de 26 anos e quatro meses de prisão em uma cela na penitenciária Modelo de Manágua.
O bispo Álvarez foi condenado em fevereiro passado, após se recusar a ser deportado da Nicarágua junto com 222 “presos políticos” libertados e enviados de avião para os Estados Unidos, como confirmado pelo próprio presidente Ortega.
No mês passado, o governo informou que estava investigando a Igreja Católica por supostamente fazer parte de uma “rede de lavagem de dinheiro” em coordenação com opositores políticos e cancelou várias contas bancárias de paróquias e dioceses em diferentes partes do país.
Ortega acusou a Igreja de se envolver nos protestos sociais de 2018, que o governo classificou como uma “tentativa de golpe fracassada”. Em março passado, ele ordenou a “suspensão” das relações com o Vaticano e um ano antes expulsou do país o núncio apostólico Valdemar Sommertag, que ofereceu interceder pela libertação dos “prisioneiros políticos”.
De acordo com a pesquisadora de temas religiosos Martha Molina, com a saída das quatro religiosas brasileiras, o número de freiras que abandonaram a Nicarágua desde 2018 chega a 40, período durante o qual 77 padres nicaraguenses e estrangeiros foram forçados a deixar o país. Uma das primeiras e mais massivas saídas foi a de 18 freiras da ordem da Madre Santa Teresa de Calcutá, em julho de 2022.
De acordo com a ONG Fundação del Río, também fechada pelo governo, pelo menos 3.364 associações sem fins lucrativos foram fechadas na Nicarágua desde 2018. Isso resultou em perdas de 255 milhões de dólares em projetos suspensos, cerca de 24.000 empregos diretos e 3,4 milhões de nicaraguenses em situação de vulnerabilidade, perdendo ajuda para sua subsistência básica.
(Com informações da AP)
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