A 11 dias da eleição, os republicanos têm mirado em territórios profundamente azuis (como são chamados os redutos democratas) que lhes permitiriam criar uma onda que poderia se traduzir em uma maioria significativa na Câmara.
O partido Republicano só precisa de cinco cadeiras para virar a Câmara, e poderia obter esses assentos só no Empire State, como escreveu Harry Enten, da CNN , na quinta-feira (27). Além disso, a corrida eleitoral nos locais que decidirão o destino do Senado também parece estar apertando, como no estado do Arizona, por exemplo, onde o senador democrata Mark Kelly já teve uma clara vantagem.
No debate desta semana, os democratas também foram abalados por uma performance duvidosa de John Fetterman, candidato ao Senado pela Pensilvânia que ainda possui sequelas auditivas e de processamento após sofrer um derrame.
O estado representa a melhor chance do partido conseguir uma cadeira, e pode ser fundamental para manter os democratas no controle do Senado, com 50 assentos para cada legenda e onde a vice-presidente Kamala Harris tem o voto de desempate.
Em conversa na quinta-feira (27) com Biden e a governadora de Nova York, Kathy Hochul, o líder da maioria no Senado, Chuck Schumer, disse que achava que o debate da Pensilvânia “não nos prejudicou muito”, mas expressou preocupação com a corrida eleitoral na Geórgia, dizendo que é o estado “onde estamos indo ladeira abaixo”.
A perda de qualquer uma das casas pode ser desastrosa para o presidente, que atualmente se prepara para uma enxurrada de investigações republicanas envolvendo seu governo, sua gestão da retirada dos EUA do Afeganistão e os negócios de seu filho, Hunter Biden, que está sob investigação do Departamento de Justiça.
Há tanta incerteza nas pesquisas após as últimas eleições, que é muito cedo para dizer, com propriedade, qual o status da corrida eleitoral. Mas o discurso de Biden na quinta-feira (27) refletiu o peso dessas eleições para os democratas, e sugeriu uma reafirmação do padrão histórico em que presidentes de primeiro mandato sofrem uma derrota nesse tipo de eleição, isso após seu partido ter nutrido esperanças de ir contra essa tendência, na esteira da Suprema Corte americana ter anulado a decisão judicial que permitia o amplo acesso ao aborto no país em julho deste ano.
Basicamente, Biden está sendo forçado a defender, diante dos americanos, a ideia de que as coisas não estão tão ruins quanto parecem, apesar das pesquisas mostrarem que a população está insatisfeita com a economia. Seu discurso demonstrou a impossibilidade política de destacar aspectos inegavelmente positivos da economia – incluindo números otimistas de crescimento do PIB divulgados quinta-feira (27) e uma taxa de desemprego historicamente baixa – quando a inflação está em sua maior alta em quase 40 anos. Entretanto, as advertências de Biden sobre disputas políticas ferozes com republicanos por direitos e gastos do governo, em um possível confronto sobre o aumento do teto da dívida, serviram como previsão do que podem ser anos sofridos em Washington se o controle político for dividido entre os partidos.
O presidente advertiu que o controle do Congresso pelo partido Republicano detonaria uma “bomba relógio” na economia. “Eles vão vir atrás da previdência”, disse Biden em evento em Syracuse. “Eles vão fechar o governo, se recusar a pagar as contas pela primeira vez na história, e colocar a América numa situação de inadimplência a menos que cedamos às suas exigências de cortar a previdência e o Medicare”.
“Nada criará mais caos ou causará mais danos à economia americana”, comentou o presidente, admitindo que os democratas sempre alertam sobre os riscos para a previdência social nas eleições, mas também argumentando que as propostas dos senadores republicanos Rick Scott, da Flórida, e Ron Johnson, de Wisconsin, desta vez realmente ameaçam o programa de aposentadoria.
O discurso de Biden argumentou que, quando se concretizarem, suas políticas irão reparar décadas de perdas na indústria americana. Ele alegou que seus projetos de lei, marca registrada de seu governo e que foram aprovados numa onda legislativa (incluindo um projeto bipartidário de infraestrutura, uma lei destinada a fomentar a produção de semicondutores nos EUA, e outra para criar uma economia de energia limpa), trariam empregos e prosperidade.
O presidente declarou ainda que sua proposta de gastos sociais aprovada no meio do ano beneficiaria ainda mais os americanos, uma vez que cortaria custos de saúde de longo prazo. Mas a questão é que todas essas medidas – se forem bem sucedidas – não se concretizarão a tempo de serem sentidas nesta eleição. Existe a chance de que elas possam ajudar Biden em 2024, se ele decidir concorrer à reeleição, mas, por enquanto, elas são só uma aspiração.
As pesquisas da CNN/SSRS desta semana em estados onde a disputa eleitoral é grande refletem a situação política quase impossível que os democratas enfrentam nas corridas para o Congresso e para governador.
Dos eleitores ouvidos, 47% em Wisconsin, 46% em Michigan e 44% na Pensilvânia disseram que a economia e a inflação são a questão mais importante que afeta seu voto. Em cada estado, os números mais que dobram quando o assunto é a segunda questão de maior preocupação – o aborto.
Os democratas esperavam que a indignação com a decisão da Suprema Corte tivesse neutralizado o ônus econômico antes do pleito em 8 de novembro. Faltando 11 dias para as eleições, todas as evidências sugerem que isso não está acontecendo, e os republicanos têm reforçado as mensagens sobre economia e criminalidade.
Estas últimas chegaram até a disputa para governador em Nova York – estado que não elege um republicano há duas décadas – e a tornaram inesperadamente competitiva . Biden esteve com Hochul na quinta-feira (27) em Syracuse, que também é o cenário de uma corrida legislativa acirrada.
Em uma amostra da urgência, os democratas estão lançando mão de, provavelmente, sua melhor arma: o ex-presidente Barack Obama, que visitará cinco estados, começando na Geórgia na sexta-feira (28) à noite, e gravou quase vinte comerciais para a televisão para democratas e comitês de campanha do partido, com novos anúncios aparecendo quase todos os dias nesta semana.
Boas notícias para o crescimento e a desconexão econômica de Biden começou o dia com algumas boas e inesperadas notícias – a economia se recuperou no último trimestre a uma taxa anualizada de 2,6%, de acordo com estimativas iniciais.
O presidente apresentou os números como “mais uma prova de que a recuperação econômica continua a avançar”. O problema, contudo, é que ele estava invocando a visão de uma economia que muitos americanos não reconhecem.
A desconexão entre as duas realidades – a de uma economia que está tendo um forte desempenho em muitas áreas, segundo dados, e a experiência vivida no país – poderia muito bem condenar os democratas.
Esta eleição está se revelando uma lição objetiva sobre o pernicioso impacto político da inflação – algo que muitos americanos adultos nunca vivenciaram, já que a última vez que ela lançou sua força sombria sobre o dia a dia no país foi nos anos 1980. Quando a renda de um eleitor não acompanha seus custos, especialmente no caso de produtos básicos como carne, pão, ovos e gasolina, ele acaba buscando bodes expiatórios. E Biden, como o presidente no poder, leva a culpa.
Biden, por sua vez, culpa fatores externos pelo aumento dos custos de vida, incluindo a invasão da Ucrânia pelo presidente russo Vladimir Putin, algo que também aumentou os preços da gasolina – embora agora estejam diminuindo –, e as consequências da disrupção da cadeia de suprimentos durante a pandemia.
Os republicanos culpam Biden por inundar o sistema com bilhões de dólares em dinheiro e colocar a economia em um ciclo de superaquecimento.
Em entrevista a Phil Mattingly, da CNN, na quinta-feira (27), a secretária do Tesouro, Janet Yellen, pediu paciência, uma vez que muitas das medidas que o governo tomou para promover a economia levarão tempo para entrar em ação. Mesmo assim, para Yellen, “a inflação está muito alta – é inaceitável e os americanos sentem isso todos os dias”, admitiu na entrevista exibida no programa “Erin Burnett OutFront”.
O presidente se encontra agora na difícil situação de tentar reivindicar crédito pelos aspectos otimistas da economia, ao mesmo tempo em que demonstra empatia pela dor que muitos americanos estão sentindo. Quando foi vice-presidente no governo Obama, a Casa Branca enfrentou um problema semelhante. A economia estava lentamente se recuperando após a Grande Recessão, mas muitos americanos não sentiam isso em um momento de alto desemprego. Obama argumentou, às vésperas das eleições de meio de mandato de 2010, que entregar o controle do Congresso aos republicanos seria como dar as chaves do carro de volta para as pessoas que o conduziram para uma vala. Mas os eleitores não estavam felizes, e os republicanos tomaram o controle da Câmara e tiveram grandes ganhos no Senado.
Agora, por conta do alto custo de vida, Biden vai andar numa corda bamba política parecida. “As pessoas continuam a ter muitas dificuldades com a inflação. Eu cresci em uma comunidade, em um lugar onde meu pai dizia, se no final do mês o que você ganha não paga todas as contas, você tem um problema de verdade”, contou Biden nesta semana em um evento virtual para arrecadar fundos para Cindy Axne, representante do estado de Iowa que disputa uma reeleição difícil.
“E mesmo que a inflação seja mais baixa aqui do que na maioria dos países desenvolvidos, sei que isso não serve de consolo para ninguém sentado à mesa da cozinha, tentando colocar comida na mesa”, continuou o presidente.
Seu comentário demonstra que Biden entende, de forma profunda, o problema que possivelmente será a condenação dos democratas nesta temporada eleitoral. Mas não há nada no curto prazo que ele possa fazer a respeito.
Este conteúdo foi originalmente publicado em Análise: Biden terá ressentimento pela frente se democratas sofrerem derrota no site CNN Brasil.