Uma pesquisa da Universidade de São Paulo (USP), publicada este ano, identificou 15 componentes químicos em diferentes concentrações no mar do litoral norte paulista, mais especificamente em Ubatuba. Elementos como cocaína e cafeína foram encontrados na água.
O estudo, conduzido pela doutora em ciências Luciana Frazão, do Instituto de Oceanografia, analisou amostras da água marinha. A principal suspeita é de que as substâncias tenham chegado ao oceano através do esgoto, por meio de urina e fezes humanas.
Uma das análises revelou a presença de benzoilecgonina, substância liberada na urina após o uso de cocaína, além de traços da própria droga.
Confira a lista de substâncias identificadas:
- Benzoilecgonina: liberada pela urina após metabolização da cocaína.
- Cocaína: droga estimulante.
- Rosuvastatina: usada para reduzir os níveis de colesterol.
- Clopidogrel: um anticoagulante.
- Carbamazepina: usada no tratamento de doenças neurológicas.
- Valsartana: usada no tratamento de hipertensão.
- Losartana: também usada no tratamento de hipertensão.
- Enalapril: dilata os vasos sanguíneos para auxiliar o coração a bombear sangue.
- Atenolol: usado no tratamento de hipertensão.
- Propanolol: também usado no tratamento de hipertensão.
- Orfenadrina: usada em relaxantes musculares.
- Diclofenaco: anti-inflamatório.
- Paracetamol: analgésico.
- Cafeína: presente no café, alimentos e estimulantes.
A pesquisa não identifica a origem exata e como esses componentes chegaram ao mar, mas a principal hipótese é que tenham sido transportados pelo esgoto, provenientes de fezes e urina humanas.
“As características físico-químicas desses compostos não permitem sua completa diluição, e os tratamentos de esgoto não os eliminam, até porque são muitos e ainda não se conhecem os efeitos de todos eles”, explica a pesquisadora Luciana Frazão.
Segundo a análise, os componentes foram encontrados não apenas na região costeira, mais próxima da faixa de areia, mas também em áreas distantes, em alto-mar. Isso indica que estão em alta concentração no oceano, afetando todo o ecossistema marinho.
Ainda não se sabe quais são os riscos diretos para a saúde humana. No entanto, a pesquisadora alerta que essas substâncias podem contaminar peixes que são consumidos pela população.
No Rio de Janeiro, por exemplo, foi identificada a presença de cocaína em tubarões no mar. Esses animais, pertencentes a uma espécie consumida na alimentação, foram coletados de pescadores que abastecem o comércio local.
De acordo com o estudo, os animais também estavam sendo contaminados pelo esgoto, através de fluidos humanos.
Ou seja, os sistemas de tratamento de esgoto não estão conseguindo filtrar todos os medicamentos e drogas que passam pelas redes, permitindo que essas substâncias alcancem o mar. A pesquisadora Luciana Frazão alerta que isso representa um risco tanto para o meio ambiente quanto para a saúde humana.
“De forma semelhante às emissões de dióxido de carbono na atmosfera, cujo acúmulo a longo prazo levou ao efeito estufa e à atual crise climática, os PPCPs [produtos farmacêuticos e de cuidados pessoais] também podem se acumular lentamente. Esse acúmulo pode resultar em mudanças significativas que passam despercebidas até que um ponto de inflexão seja atingido, o que pode levar a consequências graves e irreversíveis para os ecossistemas marinhos”, afirma Luciana.
GAZETA BRASIL